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 O indefinido início do Universo 

Natália Bonatti

 

Entre os grandes questionamentos da humanidade acerca da própria existência e da natureza, existem as teorias para o surgimento do Universo, como e quando esse espaço tão pouco conhecido começou a existir. No mundo ocidental estão presentes duas grandes vertentes de raízes distintas que buscam explicar essa questão: o Criacionismo e a teoria do Big Bang.

Ambas são as explicações mais populares, porém, enquanto o Criacionismo é resultado da influência da religião cristã na estruturação das sociedades europeias e das colonizadas posteriormente, a teoria do Big Bang é uma tese com base científica.

Mas existem situações nas quais as duas vertentes se encontram e religiosos tentam explicar o mundo através da ciência também. Como no caso da teoria do Átomo Primordial, proposta pelo padre belga, que também era astrônomo, cosmólogo e engenheiro, Georges Lemaître (1894-1966).

 

Como um religioso pode buscar explicações científicas para a criação do Universo, sendo que a tradição judaico-cristã compreende claramente o início do Universo explicado no livro do Gênesis? Hoje em dia os teólogos e a própria Igreja Católica assumem que o uso do gênero literário mito é comum para explicar as coisas incompreensíveis, como por exemplo, o surgimento do Universo. É importante lembrar que, para a religião, as escrituras da Bíblia tem inspiração divina, portanto o mito não é considerado uma mentira, e o padre Antonio Alves, pároco e assessor da Pastoral da Comunicação na Arquidiocese de Campinas, explica então o conceito do mito no contexto da narrativa da Criação.

 

Entrevista com o Padre Antônio Alves (Parte 1)

Entrevista com o Padre Antônio Alves (Parte 1)

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Se para a Igreja as descobertas científicas são reconhecidas como frutos do dom do conhecimento dado por Deus, a Ciência não consegue comprovar a existência desse criador, por isso são aceitas as teorias com mais sustentação em provas e experimentos, e mesmo que alguns teóricos tenham qualquer fé religiosa, no campo da pesquisa são consideradas apenas como opinião dos autores.

 

  Entrevista 

 

Rogerio Marcon, formado em Geologia pela Unicamp, atua no Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp e tem experiência em Astrofísica Solar explica um pouco dessa relação entre Ciência e Religião.

1. Alguns religiosos consideram a teoria do átomo primordial, do padre Lemaître, como a teoria do Big Bang. O senhor concorda com essa opinião?

A teoria do átomo primordial e posteriormente a teoria do Big Bang elaborada por George Gamow, que era da igreja ortodoxa russa, foi bem aceita tanto pelos cientistas com alguma formação religiosa que estavam desconfortáveis por não poderem incluir " Deus " na teoria científica quanto pelos religiosos com alguma formação científica, como o caso de Lamaître, que não conseguiam aceitar a visão racionalista da ciência. A teoria do Big Bang trouxe alguma tranquilidade para ambos os lados em uma aparente reconciliação das ideias. Se houve um Big Bang, houve algo ou alguém que acendeu o " estopim ". Eu discordo dessa ideia, inclusive há descobertas recentes que colocam sérias dúvidas na veracidade do Big Bang, como a descoberta de quasares associados a galáxias ativas com redshifts muito diferentes, o que colocaa principal ferramenta de medida dos adeptos do modelo padrão em suspeita. O Big Bang, portanto, pode nunca ter ocorrido. A existência de um criador pressupõe que este esteja separado da sua criação. Para mim faz mais sentido pensar que Criador e Criatura são uma única coisa e sempre existiram e sempre existirão. A ideia da Eternidade é muito mais misteriosa e divina que a ideia de um ser de barbas brancas que um dia resolveu criar o Universo a partir do nada. Note que eu não estou defendendo a visão ateísta, muito pelo contrário. Na minha opinião Deus é algo muitíssimo mais complexo que um simples ser criador. Ele é a própria natureza e o mistério que sempre existirá nela, por mais que novas teorias surjam.

2. Em sua teoria, Lemaître considerava plenamente aceitável a existência de um Criador que inspirasse o átomo primordial, como a Ciência reconhece isso?

A Ciência não consegue aceitar a ideia da existência de Deus porque este não pode ser comprovado por um experimento que possa ser reproduzido por qualquer um nas mesmas condições. Se a ideia de Deus é aceitável, isto não é Ciência como a concebemos porque a Ciência não aceita nada. Há que ter provas e evidências que possam ser reproduzidas em qualquer lugar por qualquer um. Neste sentido a Ciência nunca chegará a comprovar a existência de Deus.

3. Com sua experiência no campo da Astronomia e considerando as descobertas da Astronomia e da composição do Universo, principalmente através do telescópio Hubble, o senhor diria que a Ciência pode ser comparada com a religião por trazer teorias que buscam mostrar ao homem o sentido da vida e a criação do Universo?

Ciência e Religião não podem ser comparadas porque ambas partem de princípios diferentes. A Ciência se baseia em fatos que podem ser explicados por hipóteses passíveis de serem experimentadas e a religião se fundamenta em uma crença em algo que foge da realidade palpável. Algo misterioso. Uma não exclui a outra, mas a meu ver, são complementares. A dimensão do mistério sempre existirá por mais elaboradas que sejam as teorias científicas. É como se novos mistérios surgissem na medida que a ciência avança. Foi assim com a eletricidade e magnetismo, relatividade, etc...

Deus estará sempre lá na forma de um grande mistério inesgotável e eterno.

 

Foto: Natália Magalhães

 

Observar o céu pode ser uma ato sem significado ou uma forma de buscar a explicação do surgimento da vida

Todas as civilizações, desde a Antiguidade quando surgiram os questionamentos acerca da existência humana e do sentido da vida com os primeiros filósofos, buscam a resposta para o surgimento do Universo. Diversos mitos já tentaram reduzir a distância entre o homem e o místico, mas nenhuma delas pode ser assumida como verdade universal, seja qual for a crença ou teoria o ser humano precisa da fé, que não se resume ao campo espiritual, como explica padre Antonio Alves.

 

Entrevista com o Padre Antônio Alves (Parte 2)

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